POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
FRANCESCO PETRARCA
Francesco Petrarca (Arezzo, 20 de julho de 1304 — Arquà, 19 de julho de 1374) foi um intelectual, poeta e humanista italiano, famoso, principalmente, devido ao seu romanceiro. É considerado o inventor do soneto, tipo de poema composto de 14 versos. Foi baseado no trabalho de Petrarca (e também de Dante e Boccaccio) que Pietro Bembo, no século XVI, criou o modelo para o italiano moderno, mais tarde adotado pela Accademia della Crusca.
Pesquisador e filólogo, divulgador e escritor, é tido como o "pai do Humanismo". Mas esse grande latinista deve sua fama principalmente a seus poemas, redigidos em língua italiana.
Fonte, com mais informação: https://pt.wikipedia.org/wiki/Francesco_Petrarca
TEXTO EM ITALIANO - TEXTO EM PORTUGUÊS
PETRARCA, Francesco. Cancioneiro. Tradução José Clemente Pozenato. Ilustração Enio Squeff. Cotia, SP: Ateliê Editorial; Campinas, S P: Editora da Unicamp, 2014. 536 p. (Coleção Clássicos Comentados) capa dura. ISBN 978-85-679-2 (Ateliê Editorial) – 978-85-268-1217-8 (Editora da Unicamp) Ex. bibl. Antonio Miranda
I
Voi ch'ascoltate in rime sparse il suono
di quei sospiri ond'io nudriva ´l core
in sul mio primo giovenile errore
quand'era in parte altr'uom da quel ch'i' sono,
del vario stile in ch'io piango e ragiono
fra le vane speranze e ´l van dolore,
ove sia chi per prova intenda amore,
spero trovar pietà, non che perdono.
Ma ben veggio or si come alpopol tutto
favola fui gran tempo, onde sovente
di me medesmo meco mi vergogno:
e del mio vaneggiar vergogna è ´l frutto,
e 'l pentersi, e ´l conoscer chiaramente
che quanto piace al mondo è breve sogno.
II
Per fare una leggiadra sua vendetta
e punire in un di ben mille offese,
celatamente Amor l'arco riprese,
come uom ch'a nocer luogo e tempo aspetta.
Era la mia virtute al cor ristretta
per far ivi e ne gli occhi sue difese,
quando ´l colpo mortai là giù discese
ove solea spuntarsi ogni saetta.
Però, turbata nel primiero assalto,
non ebbe tanto né vigor né spazio
che potesse al bisogno prender l'arme,
overo al poggio faticoso ed alto
ritrarmi accortamente da lo strazio
del quale oggi vorrebbe, e non può aitarme.
(Soneto 1). Proêmio, em que o Poeta invoca a piedade dos leitores, pelo menos de quem "do amor provou a via" (v. 7). Ele enamorou-se de Laura aos 22 anos, seu primeiro erro de jovem. Em consequência, tornou-se objeto de conversas e riso: "fui muito tempo fábula" (v. 10). Hoje envergonha-se e se arrepende de ter sido tão leviano. A "rima esparsa" (v. 1) refere-se ao fato de que o Cancioneiro é feito de poemas soltos, sem ligação que constitua um todo homogêneo. O "vário estilo" (v. 5) indica que ele, além dos sonetos, inclui outras formas poéticas: baladas, madrigais, canções e sextinas.
I
Vós que escutais em rima esparsa o coro
dos suspiros com que eu meu ser nutria,
naquele erro em que jovem me perdia,
quando outro eu era do que sou, e coro:
no vário estilo em que eu razoo e choro
entre esperanças vãs, vã agonia,
onde haja quem do amor provou a via,
se não o seu perdão, piedade imploro.
Mas bem percebo que de todo o povo
fui muito tempo fábula, e frequente
de mim mesmo comigo me envergonho:
do divagar, vergonha é o fruto novo,
e o arrepender-me, e o ver bem claramente
que quanto agrada ao mundo é breve sonho.
II
Para de mim tomar vingança estreita
e punir num só dia muito pecado,
Amor tomou seu arco, disfarçado,
como quem por matar se põe à espreita.
Defesa pus nos olhos mui benfeita,
usando toda a força com cuidado,
quando o golpe mortal desceu-me ao lado,
que é onde sempre alveja a seta eleita.
Assim turbado no primeiro assalto,
não me sobrou vigor, nem mesmo espaço,
para tomar das armas sem demora,
ou de no topo fatigante e alto,
fugir espertamente do mau passo,
como desejo, já sem força, agora.
(Soneto 2). O "muito pecado" (v. 2) são as ofensas contra Amor (personificação frequente no Cancioneiro, munido de arco e flecha como Eros), por fugir dele ou proteger-se de suas investidas em afetos transitórios. Alvo de vingança, o Poeta põe todo cuidado em proteger os olhos, mas é atingido no coração. Ferido "no primeiro assalto" (v. 9; cf. xx, v. 14 e xxn, v. 21), não tem força nem espaço (de tempo) para reagir, nem mesmo para subir ao topo do monte da virtude, ou da razão, em retirada.
III
Era il giorno ch'al sol si scoloraro
per la pietà del suo Fattore i rai,
quando i' fui preso, e non me ne guardai,
che i be' vostr'occhi, donna, mi legaro.
Tempo non mi parea da far riparo
contra colpi d'Amor: però m'andai
secur, senza sospetto: onde i miei guai
nel commune dolor s'incominciaro.
Trovommi Amor del tutto disarmato
ed aperta la via per gli occhi al core,
che di lagrime son fatti uscio e varco:
però al mio parer non li fu onore
ferir me di saetta in quello stato,
e a voi armata non mostrar pur l'arco.
IV
Quel ch'infinita providenzia ed arte
mostrò nel suo mirabil magistero,
che cr'iò questo e quell'altro emispero,
e mansueto più Giove che Marte,
vegnendo in terra a 'lluminar le carte
ch'avean molt'anni già celato il vero,
tolse Giovanni da la rete e Piero,
e nel regno del del fece lor parte.
Di sé nascendo a Roma non fe' grazia,
a Giudea si, tanto sovr'ogni stato
umiltate esaltar sempre gli piacque;
ed or di picchi borgo un sol n'ha dato,
tal che natura e ´l luogo si ringrazia
onde si bella donna al mondo nacque.
(Soneto 3). O dia do enamoramento. "O dia" (v. 1) é a sexta-feira santa de 1327, por isso a dor do Poeta começa com a dor universal pela morte de Cristo. Nesse dia doloroso, o Poeta estava tranquilo, "de mim seguro" (v. 7). Termina acusando Amor de ter agido fora dos preceitos da honra, atingindo-o desarmado, sem sequer erguer o arco contra ela, que estava armada.
(Soneto 4). Deus criou o mundo e deu aos planetas qualidades e influxos diferentes: Petrarca refere a crença de que Júpiter era um planeta benigno, e Marte, cruel e feroz. Esse Deus vem à terra para mostrar a verdade oculta no Antigo Testamento ("as letras", v. 6) e toma dois pescadores para discípulos, numa exaltação da humildade, a mesma de quando escolheu nascer, não na capital do império romano, e sim na Judeia. Laura, "um Sol" (v. 12), nasce também num pequeno burgo (Caumont, na Provença).
O livro de Petrarca inclui 374 poemas, nas duas línguas, para quem se dispuser a adquirir a obra original (impressa). Aqui escolhemos apenas os 4 primeiros sonetos.
PETRARCA. Poemas de amor. Apresentação de Alexei Bueno. Tradução Jamil Almansur Haddad. Organização Alexei Bueno. Rio de Janeiro: Ediouro, 1998. 157 p. 12x18cm. (Col. Poemas de Amor)ISBN 85-00-00651-X Ex. bibl. Antonio Miranda
Apresentamos a seguir dois poemas em italiano e português. Os textos completos das seções Em vida de Laura e À morte de Laura, estão em algumas livrarias e sebos do Brasil, ou diretamente com a editora: EDIOURO info@ediouro-livros.com.br
EM VIDA DE LAURA
(transcrevemos apenas os dois primeiros sonetos...)
Voi ch´ascoltare in riem sparse il suono
di quei sospiri ond´io mudriva ´l core
in sul mio primo giovenile errore,
quand´era in parte altr´uom da quel ch´i´sono
del vario stile in ch´io piango e ragiono
fra le vane speranze e ´l van dolore,
ove sai chi per prova intenda amore,
spero trovar pietà, non che perdóno.
Ma ben veggio or si come al popol tutto
favola fui gran tempo, onde sovente
di me medesmo meco mi vergogno;
E del mio vaneggiar vergogna è ´l frutto,
e ´l pentersi, é ´l conoscer chiaramente
che quanto piace al mondo è breve sogno.
Vós que escutais em rimas espalhado
Desde meu peito o suspirado ardor
E que o nutria ao juvenil error
Quando era mui diverso o meu estado;
O incerto estilo por que eu ei variado
Entre a vã esperança e o vão temor,
Se vós houverdes entendido amor
Terá vossa piedade despertado.
Vejo que a todos meu amor assim
Quase sempre foi fábula somente.
E agora eu de mim mesmo me envergonho.
De minha vida vã vergonha é o fim
E o arrepender-se e o ver mui claramente
Que quanto apraz ao mundo é breve sonho.
Era il giorno eh 'al sol si scoloraro
per la pietà del suo fattore i rai,
quando i' fui preso, e non me ne guardai,
ché i be' vostr'occhi, donna, mi legaro.
Tempo non mi parea da far riparo
contr' a' colpi d'Amor-, però m'andai
secur, senza sospetto: onde i miei guai
nel commune dolor s'incominciaro.
Trovommi Amor del tutto disarmato,
et aperta la via per gli occhi al core,
che di lagrime son fatti uscio e varco.
Però, al mio parer, non li fu onore
ferir me de saetta in quello stato,
a voi armata nom mostrar pur l'arco.
Era o dia em que o sol escurecia
Os raios por piedade ao seu Fator,
Quando eu mc vi submisso ao vivo ardor
De teu formoso olhar que me prendia.
Defender-me do golpe eu não queria;
Desabrigado achou-me então Amor;
Por isso acrescentou-se a minha dor
À dor universal que assaz crescia.
Achou-me Amor de todo desarmado,
Pelos olhos, ao peito aberta a estrada,
Olhos que se fizeram mar de pranto.
Porém a sua ação não o honra tanto:
Ferir-me, sendo inerme o meu estado,
Não te visar quando eras tão armada.
PETRARCA, Francesco. Sonetos de Francesco Petrarca. Tradução de Renato Suttana. Natal, RN: Sol Negro Edições, 2013. 128 p. 14,3 x 20,5 cm Design e editoração: Márcio Simões. Tiragem: 70 exemplares.
Ex. bibl. Antonio Miranda
CCLII
In dubbio di mio stato, or piango or canto,
et temo et spero; et in sospiri e 'n rime
sfogo il mio incarco: Amor tutte sue lime
usa sopra 'l mio core, afflicto tanto.
Or fia già mai che quel bel viso santo
renda a quest'occhi le lor luci prime
(lasso, non so che di me stesso estime) ?
o li condanni a sempiterno pianto;
et per prender il ciel, debito a lui,
non curi che si sia di loro in terra,
di ch'egli è il sole, et non veggiono altrui?
In tal paura e 'n si perpetua guerra
vivo ch'i' non so più quel che già fui,
qual chi per via dubbiosa teme et erra.
CCLII
De meu estado incerto, ou choro ou canto,
e temo e espero; e entre o suspiro e a rima,
alivio o meu fardo: e Amor me lima
o peito com tal força que me espanto.
Há de jamais aquele olhar tão santo
nos meus olhos verter sua luz prima
(caso, exangue, o mereça a minha estima),
ou me condena a sempiterno pranto?
Não se importa, na altíssima morada,
com o que eles hão de ser aqui na terra,
de que ele é o sol, pois outro eu não veria?
Em tal receio e tão perpétua guerra
vivo, que já não sou quem fui um dia,
temendo e errando por ignota estrada.
CCCIII
Amor, che meco al buon tempo ti stavi
fra queste rive, a' pensier' nostri amiche,
et per saldar le ragion' nostre antiche
meco et col fiume ragionando andavi;
fior', frondi, herbe, ombre, antri, onde, aure soavi,
valli chiuse, alti colli et piagge apriche,
porto de l'amorose mie fatiche,
de le fortune mie tante, et si gravi;
o vaghi habitator' de' verdi boschi,
o ninphe, et voi che 'l fresco herboso fondo
del liquido cristallo alberga et pasce:
i di miei fur si chiari, or son si foschi,
come Morte che 'l fa; cosi nel mondo
sua ventura a ciascun dal di che nasce.
CCCIII
Amor, que ao lado meu faz tempo estavas
nestas plagas, do nosso ardor amigas,
e por saldar promessas já antigas
comigo e os rios conversando andavas;
brisas, matas, campinas, sombras, cavas,
campos, vales, grotões onde te abrigas,
meu sentir, e porto onde as fadigas
tuas, fortuna incerta, desagravas;
e, ó vós, do bosque belos moradores,
ninfas, e vós que o fresco e verde fundo
o líquido cristal alberga e pasce;
meus dias claros hoje não têm cores,
que assim os faz a Morte, e assim no mundo
seu destino a cada um desde que nasce.
Página publicada em janeiro de 2018; página ampliada em fevereiro de 2018
Ampliada em maio de 2019
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